13.9.06

1843

"É erro vulgar confundir o desejar com o querer. O desejo mede os obstáculos; a vontade vence-os"
Alexandre Herculano


«Que somos nós hoje? Uma nação que tende a regenerar-se: diremos mais: que se regenera. Regenera-se, porque se repreende a si própria; porque se revolve no lodaçal onde dormia tranquila; porque se irrita da sua decadência, e já não sorri sem vergonha ao insultar de estranhos; porque principia, enfim, a reconhecer que o trabalho não desonra, e vai esquecendo as visagens senhoris de fidalga.

Deixai passar essas paixões pequenas e más que combatem na arena política, deixai flutuar à luz do sol na superfície da sociedade esses corações cancerosos que aí vedes; deixai erguerem-se, tombar, despedaçarem-se essas vagas encontradas e confusas das opiniões!

Tudo isto acontece quando se agita o oceano; e o mar do povo agita-se debaixo da sua superfície. O sargaço imundo, a escuma fétida e turva hão-de desparecer. Um dia o oceano popular será grandioso, puro e sereno como saiu das mãos de Deus. A tempestade é a precusora da bonança. O lago asfaltite, o Mar Morto, esse é que não tem procelas.

O nosso estrebuchar, muitas veze colérico, muitas mais mentecapto e ridículo, prova que a Europa se enganava quando cria que esta nobre terra do último ocidente era o cemitério de uma nação cadáver. Vivemos: e ainda que semelhante viver seja o delírio febril de moribundo, esta situação violenta, aos olhos dos que sabem ver, é uma crise de salvação, posto que dolorosa, e lenta. Confiemos e esperemos: o nome português não foi riscado do livro dos eternos destinos.»

Alexandre Herculano
Duas Épocas e Dois Monumentos (Questões Públicas - 1843)



bvtana

3 Comments:

At 2:13 da manhã, Anonymous Anónimo said...

É estranha a actualidade - ou perenidade, ou melhor talvez "cíclica actualidade" - deste notavel texto.
Vou reler Herculano, a quem nunca liguei demasiado. Já valeu passar por aqui. Até breve.

Madalena Reis Pinto

 
At 11:33 da manhã, Anonymous Anónimo said...

a Nação está muito bem! basta ver o homem simples que faz grandes coisas e dá a volta com os símbolos da Pátria.
o Estado desde a revolução liberal que se comporta como um protectorado. Os primeiros ministros, os governos, os parlamentares, os parlamentares europeus dependem em exclusivo do que os seus mentores estrangeiros lhes dão para fazer...houve até um que o mandaram sair de primeiro ministro e ir para funcionário directo deles em Bruxelas.
algumas pessoas que andam por perto do Estado ainda têm consciência de que a Nação não devia ser governada como um protectorado, porque tem independência na Alma, porque no dia em que souber que o Estado a governa como um protectorado não vai gostar...devia produzir o que come...devia pescar o seu peixe...devia ter marinha mercante...devia ensinar a sua cultura...e essa tensão tem duzentos e cinquenta anos:
NAÇAO INDEPENDENTE, FRUSTRADA POR UM ESTADO QUE É O DE UM PROTECTORADO.
O Alexandre Herculano era como sabem funcionário público e foi Presidente de uma Câmara, a de Belém( a sala do Senado dessa Cãmara ainda existe, é uma sala de aula de uma Escola Primária e é muito bonita)e esteve quase a ser apanhado pela teia que os estrangeiros tecem para ficarem ministros do protectorado. Honra lhe seja feita...no fim juntou-se aos homens humildes da Nação que fazem por ela grandes coisas.

 
At 7:42 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Desconfio que a actual oligarquia do centro - o «partido do Estado» - vá longe.
Já se lhe começa a ver, de resto, uma Justiça privativa ...

 

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