GOVERNAR OS PORTUGUESES
“Compreendo que seja apetecível governar os portugueses e que certas pessoas morram de ansiedade por não praticarem regularmente esse acto libertador.”
V. Pulido Valente
Sendo os tempos, segundo alguns pensadores, próprios para uma refundação da “direita”, e aparecendo, ao mesmo tempo, como possíveis líderes desse espaço figuras tão estimulantes como Telmo, Matos Chaves, Ribeiro e Castro, Mendes e o Morgadinho de Gaia, virá a talhe de fouce encorajar os adeptos da referida área com lenitivos soltos, sorvidos da Historia.
Ora, seguindo ensinamento de VPV, desde 1820 a 2005, a Direita governou em números redondos 125 anos e a Esquerda 58.
Isto por si já mostra qualquer coisa.
“A Esquerda governou várias vezes depois de revoluções que o imobilismo da Direita tinha tornado inevitáveis: três anos entre 1820 e 1823, três anos entre 1836 e 1839, quatro meses e meio em 1846, um ano entre Julho de 1868 e Agosto de 1869, dois meses em 1870, quinze anos (com três interrupções que duraram por junto dois), entre 1910 e 1926, e quatro anos e meio, entre 1974 e 1978.
Deste tempo seria justo descontar aquela parte em que a Esquerda, estando no poder, se ocupava essencialmente em destruir a Esquerda e a criar condições para um rápido regresso da Direita.
(...)
A Esquerda também governou aos bochechos, se por qualquer razão a Direita preferia que fosse ela a carregar com o odioso de situações intoleráveis
(...)
Por fim a Esquerda governou nas épocas em que nada a distinguia da Direita e, portanto, inspirava alguma confiança, embora condicional e contrariada, aos interesses estabelecidos
(...)
De resto, cento e vinte e cinco anos, a Direita mandou.
(...)
Em Portugal não há, jamais houve, qualquer possibilidade do que no reles calão dos nossos políticos se chama alternância de poder.
A Esquerda constitucional apareceu no continente europeu pela aliança de uma parte da classe média com a pequena burguesia e as classes trabalhadoras.
Os partidos radicais e após eles os partidos sociais-democratas fundaram-se nisto, ou seja, na divisão da classe média entre a Direita e a Esquerda ou, se se preferir, entre o Poder e a Oposição, entre os interesses estabelecidos e aqueles que esses interesses exploravam, oprimiam ou injustamente subordinavam.
Ora, para que a classe média se divida, é necessário que ela seja grande e forte. Uma classe média pequena e fraca raramente está em situação de desafiar o poder e os interesses dominantes.
Não tem força para os vencer nem, quando por acaso os vence, para se impor à pequena burguesia e aos trabalhadores a quem se aliou.
Os setembristas e os republicanos ficaram nas mãos da plebe de Lisboa, sob a forma de batalhões nacionais ou de múltiplos grupos terroristas que o Partido Democrático de Afonso Costa energicamente patrocinava.
No 25 de Abril, os adeptos da “justiça social” depressa perceberam o que se arriscava a suceder-lhes se persistissem nessa nobre inclinação.
A classe média portuguesa só se revolta em desespero: ou por pura miséria (1820, 1836) ou para fugir à guerra (1974), ou porque a Direita a mantém à margem, sem a satisfazer e sem a reprimir (1868, 1910).
Caso contrário tende a juntar-se aos seus legítimos superiores e a servi-los, veneradora e grata, como o exemplar “feitor dos ricos” que foi Salazar.
Daí o velho impulso para a União Nacional. Desde pelo menos 1834 até ao fim do sec. XIX, a Esquerda desejou apenas que a deixassem “entrar” e sentar-se à mesa. Detestava ser Esquerda e agir independentemente como Esquerda, pedia o tempo todo a fusão dos partidos e a conciliação dos portugueses.
Era, como se dizia, “pasteleira”, apologista de se misturar as coisas e do “sempre cabe mais um”. Contentava-se com migalhas: os seus grandes heróis – Saldanha, Passos, José Estêvão, Rodrigues Sampaio, Casal Ribeiro – mudaram-se para a direita de armas e bagagens ou especializaram-se em entregar, ou propor que se entregasse o poder à Direita em troca de uma modesta recompensa, como Sá da Bandeira ou António José de Almeida.
A Direita, aliás, percebeu invariavelmente o que a Esquerda queria.
Tirando os Absolutistas e Salazar, evitou aparecer com a cara dela e fingiu fazer um “pastel” ao gosto geral. Foi assim com os Regeneradores e foi assim com o abstruso Partido Social-Democrata de Cavaco.
A classe média meteu-se lá inteirinha, contente que nem um rato, e não sai de lá, a menos que se sinta ameaçada na bolsa e na vida....”
(VPValente- 1988)
bv
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