10.8.06

Fato profugus

“He was the kind of man who was ready for anything, who hoped for nothing…”
ysimon



"O deserto não é a ausência.
É o estado anterior à presença, antes da travessia dos nómadas, antes da paragem dos aventureiros...

Donde vem esta nostalgia que trazemos connosco, que dá por vezes o sentimento de termos perdido a parte de imensidão que é nossa....

Haverá um espaço perdido, que pode ressurgir ao sabor dos nossos confrontos com as imensidões que cruzamos, o céu, os oceanos, os desertos, a noite...

Trará o código genético, além dos testamentos, o vestígio de uma viagem sem limites através dos esconderijos do universo...

Há nestes impulsos misteriosos para espaços infinitos, a marca de um esforço para o reencontro com uma imensidão dantes conhecida e, depois, desaparecida...

A vida seria então a construção de um invólucro que desamarra do mundo uma parcela de infinito, para lhe dar um peso, um lugar, um princípio e um fim.” *



“Os desertos da Líbia... as mais belas palavras que conheço. Líbia, uma palavra sensual, arrastada, uma nascente secreta... era uma das poucas palavras em que se ouvia a língua virar uma esquina... um homem será como rios de água na areia seca.

Vivi durante anos no deserto, e acabei por acreditar nestas coisas. É um lugar de recessos. O trompe l´oeil do tempo e da água. O chacal com um olho voltado para trás e outro posto no caminho que pensamos tomar. Traz nos dentes pedaços do passado que nos depõe aos pés e quando todo esse tempo se nos revela verificamos que já o conhecíamos.

No deserto, um homem pode agarrar a ausência na concha das mãos, sabendo que tem nela um alimento mais precioso que a água.

Estes homens de todas as nações viajam ao cair da tarde, pelas seis horas, quando reina a luz dos solitários.” **


*Yves Simon (the wondrous voyager)
** Michael Ondaatje (the english patient)

guidosarrasa

7 Comments:

At 12:33 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Fabuloso. Aos amantes do deserto só são comparáveis os do mar. O resto é outra coisa

 
At 12:43 da tarde, Blogger Raquel Sabino Pereira said...

Subcrevo... e com comoção. A sensação é a mesma. Penso que em tudo comparável a pairar no Espaço.


Mas... Como pude perder este blog estes anos todos? Vou colocar um link no meu Atlântico Azul e passarei a ser visitante assídua.

Parabéns aos bloguistas e ao autor deste post.

 
At 4:20 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Se este blogue apenas tivesse este post estava justificado. Cum laude.

AtV

 
At 4:28 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Majestoso

 
At 5:48 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Os três últimos parágrafos do excerto de Yves Simon, são a mais bela metáfora da Terra, da Vida e do Universo. Do Nome de Deus.

 
At 6:31 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Um dos melhores posts de sempre da nossa blogosfera.
Simplesmente notável.

 
At 6:32 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Isto é muito bom. Mesmo!

Artur Goulão

 

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