30.12.04

DE UM ANO PARA O OUTRO


“Ainda somos o vamos deixar de ser e já somos o que seremos”
Paul-Eugéne Charbonneau


“Do mal ficam as mágoas na lembrança
E do bem, se algum houve, as saudades.”
(?)


“Para qué llamar caminos
a los surcos del azar?”
Antonio machado



As correntes que clandestinas navegam entre nós mostram-nos os mistérios sem os desvendar, descobrindo e ocultando as proximidades, as distâncias.
Os desejos, as nostalgias, os perigos e as paixões confluem, vorazes, nos signos da pertença e desatá-los, um a um, é o sal de toda a vida: o tráfico dos sentimentos e dos encontros não identificados.

Fundamental é estar desperto para os acasos e, no descobrimento, guardar para o mistério o bocado que lhe pertence e é só seu.

Quanto da beleza é a sabedoria do véu - disse a poetisa desregrada – e havia qualquer coisa no seu rosto, como que um recorte contra a luz do dia, um fragmento de ilusão, ou antes, a ironia desencantada de quem sabe uma parte da verdade e que, feita memória ou estátua, ficará aqui para sempre, encerrada no espírito do tempo.

O viajante despojado acreditava que o homem é a soma das suas coisas, ainda que um pequeno número de homens afortunados seja a soma de uma ausência de coisas.

Seja como for, com o pano de fundo shakespeariano do “nature and nurture”, atravessamos para 2005, como o fizemos para outros, com António Machado:

“Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
Caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.
Al andar se hace camino,
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante, no hay camino,
sino estelas en la mar.”


lourençobravo