22.3.06

Abordagens

"Mas, meus senhores, antes de tudo não temos marinha. Singular coisa! Nós só temos marinha pelo motivo de termos colónias, mas justamente as nossas colónias não prosperam porque não temos marinha! A nossa marinha, ausente dos mares, sulca profundamente o Orçamento.
Gasta 1.159.000$00!
(...)
A Pedro Nunes está em tal estado que, vendida dá uma soma que o pudor nos impede de escrever. O Estado pode comprar um chapéu no Roxo com a Pedro Nunes mas não pode pedir troco.
O Mindelo tem um jeito: é andar de lado; e uma teima: deitar-se. No mar alto, todas as suas tendências, todos os seus esforços são para se deitar. Os oficiais de marinha que embarcam neste vaso fazem disposições finais. O Mindelo é um esquife- a hélice.
A Napier saiu um dia para uma possessão: chega, e não pode voltar. Pediu-se-lhe, lembrou-se-lhe a honra nacional, citou-se-lhe Camões, o sr Melício, todas as nossa glórias. A Napier insensível não se mexeu.
(...)
O arsenal,humilhado no género navio, começou a tentar o género lancha. Fez uma a vapor. Lança-se ao Tejo, alegria nacional, foguetes, bandeirolas, e a lancha não anda! Dá-se-lhe toda a força, geme a máquina, range o costado, e a lancha imóvel! Mas de repente move-se: a alegria inesperada e desilusão imediata! A lancha recuava: tinha-se erguido uma brisa que a repelia. Em todas as experiências a lancha recuava com extrema condescendência: brisa ou corrente tudo a levava para trás. Para diante não ia. Pegava-se. O arsenal tinha feito uma lancha a vapor que só podia avançar...puxada por bois. O país riu durante um mês.
O arsenal roeu a humilhação, e encetou a espécie caique. Ainda o havemos de ver, no género construção em madeira, cultivar o...palito!"


Eça de Queirós


cristovaodovale