21.5.05

ESTADO PROVIDÊNCIA

"(...)
O salazarismo permanecente não passa , com efeito, desse respeito que, no fundo, todos queremos ter pelo nosso avozinho de outros tempos, esse "homem de génio e de génios" que usou a autoridade autoritária para manter certos valores que se opunham aos chamados "ventos da história".

É impossível dizer que esse avô, teimoso na sua coerência, não teve razão. Ele teve razão, mas teve-a fora do tempo. Com já há anos escrevi, "Salazar não é herdeiro do Marquês de Pombal, mas o Príncipe Perfeito, mais paternalista do que totalitarista. Não é o 'fuhrer' nem o 'duce', mas o presidento do ministério que faltou ao rei D. Carlos para fazer regressar a monarquia aos tempos de D. João III, promovendo uma nova Contra Reforma comandada por lentes de leis e com uma legião missionária de sargentos e bacharéis. Ele próprio confessou um dia a Manuel Múrias que 'gostaria de ser primeiro ministro de um rei absoluto'".

Salazar, com efeito, como todos os grandes professores, foi também "um avô de si mesmo", quando aplicou no governo as teorias que aprendeu e ensinou na universidade. A ele devemos a construção do nosso Estado Providência nos anos trinta, misturando as medidas de Napoleão III e Bismarck com algumas fórmulas do "New Deal" de Roosevelt.

Preferiu, contudo, manter-se sempre "orgulhosamente só", a nível do poder. Isto é, nunca deixou enredar-se pelas sereias do "demo" e da "demos", que o convidavam a submeter-se a qualquer tipo de sufrágio popular, coisa que deixou para os seus Presidentes da República e os seus deputados. Ele continuou "vigário de Deus" e "funcionário da comunidade", recebendo a "potestas" sem intermediários e relendo e praticando os catolicíssimos livros de ensinança de príncipes, de Frei Amador Arrais ao Padre Manuel Bernardes.
(...)"
(J.A.Maltez- Maio,1989)


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