29.12.05

A ler

O texto de Pacheco Pereira publicado, hoje, no Público (sem link, como já se sabe), sobre o Papa Bento XVI e a sua influência nos meios intelectuais do Ocidente. Três notas apenas:
1. Compreende-se que PP considere "raro" e, de certa forma, surpreendente, a curiosidade intelectual que este Papa desperta. Mas, como o próprio PP refere, "a solidez teórica de Ratzinger" não surgiu com a sua passagem a Bento XVI. Ratzinger, uma das "revelações" do Concílio Vaticano II, é autor de uma obra reconhecida (e polémica) que procura, acima de tudo, reafirmar o primado da tradição na fé e na teologia. Daí o uso do camauro e a importância que sempre deu à liturgia. Neste ponto, o seu pontificado continua o de João Paulo II de quem foi, aliás, muito próximo. É natural que a sua eleição tenha amplificado o interesse pela sua vida e pela sua obra. Mas, há algum tempo, que a sua interpretação da doutrina está na origem de muitos debates.
2. Não sei se a ameaça do fundamentalismo islâmico contribuiu, como defende PP, para o reforço de "um sentimento de comunidade, de pertença a uma mesma tradição cultural" numa Europa que, segundo Ratzinger, se caracteriza pelo "relativismo moral". Ou se o interesse que os europeus sentem pelo Papa não corresponde, antes, ao interesse que este sempre lhes dedicou. Enquanto João Paulo II procurou comaltar a indiferença da Europa, com uma Igreja espalhada pelo mundo (nomeadamente pelo Terceiro Mundo), Bento XVI nunca escondeu (até pelo nome que escolheu) a sua esperança no "renascimento" de uma Europa, assente nos valores do cristianismo que definem a sua identidade. A Europa, segundo Ratzinger, ou é cristã ou não é.
3. O dinamismo teológico do cristianismo, tanto católico, como reformado, em contraste com a cristalização do Islão, leva PP a concluir que uma religiâo que tem uma Igreja e, na versão católica, uma hierarquia que termina no Papa, fala mais facilmente "para tempos diferentes, de formas diferentes, mesmo que a Voz seja a mesma". Seria assim, se o contraste confirmasse apenas as virtualidades do cristianismo e deixasse de lado as particularidades do Islão. Mas é no Islão que devem ser encontradas as razões que justificam este contraste. Basta ter presente a teologia judaica para se perceber que a hierarquia não é uma condição indispensável ao dinamismo da teologia.
ccs

5 Comments:

At 9:56 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Em relação ao ponto 3, parece-me que a questão é o facto de não se poder falar em teologia no caso do Islão. Essa é talvez a diferença fundamental entre o Judaico-cristianismo e o islamismo, e a existência de uma igreja, no caso católico, embora não determinante, como refere, ajuda a que haja regras e uma Voz. Não percebi muito bem, no entanto o que pretende dizer com a frase "se o contraste confirmasse apenas as virtualidades do cristianismo e deixasse de lado as particularidades do Islão".

 
At 10:16 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Quem tiver interesse, pode ver o texto completo do artigo de JPP no "Ecos da Província":
Serviço Público: JPP e Bento XVI

 
At 10:18 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ou seja, se as razões que justificam o contraste entre o cristianismo e o Islão se explicassem apenas pelas características do primeiro, sem levar em linha de conta as particularidades do segundo - o facto de, como diz, não se poder falar de uma teologia neste caso. Quanto à hierarquia, é óbvio que esta ajuda a que haja regras e uma Voz mas, por si só, não determina o tal dinamismo de que fala PP

 
At 10:25 da tarde, Anonymous Anónimo said...

O texto também já está disponível no "Abrupto".

 
At 11:17 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Têm a certeza de que não há uma teologia islâmica? Não há, ou é ela desconhecida por cá?...

 

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