7.10.04

O BOM, O MAU E O VILÃO

“This affair must be unravelled from within.” – Poirot tapped his forehead. – “Those little grey cells. It is ‘up to them’ – as you say over here.”

Agatha Christie, “The Mysterious Affair at Styles”


Na ressaca da (profícua em impropérios) campanha do PS – é…essa mesmo…essa que ficou rapidamente submersa, repousando nos anais da História do Largo do Rato – ouve-se o “cabuum” periódico do chavão “terramoto político”.

O caso, à boa maneira portuguesa, será tratado ad nauseam. Tudo lutará para ganhar o exclusivo do próximo espirro de Marcelo, da próxima palavra de Gomes da Silva. Todos quererão ter mais inflamadas palavras, mais indignações disfarçadas.

Há, de facto, um não sei quê de muito errado. Talvez a falta de alguém conseguir ler nas estrelas.

Todos vamos ter saudades de Marcelo. E isso é simples.

Ninguém via o “Jornal nacional” ao Domingo. Ao Domingo, era “dia de Marcelo”. O que se perde é o gosto de ouvir não o comentador – a palavra sempre lhe assentou mal, é quase indigna – mas Marcelo. Por ele próprio. Os comentários de Marcelo eram o último resquício de um Portugal que se perdeu, o da aldeia unida e atenta ao saber de quem sabe mais. Esta é que é a verdade.

Há um desvio de atenções para uma censura que nunca seria possível a Marcelo. Se Marcelo quizer falar, falará. Sempre. Com audiência.

Marcelo sai da mesma maneira que deu por terminada a AD com Paulo Portas. Ou é como eu quero ou não é. Por isso mesmo, a fraca qualidade dos entrevistadores de Marcelo sempre foi notória. O jovem Júlio Magalhães, babando mesmo quando a piada era média, ao bom nível do aluno graxista. José Carlos Castro, nunca se lhe viu perante Marcelo ousar pintalgar o tempo de antena com grosserias como há dias fez com o Ministro António Mexia, ao terminar a entrevista à traição, dizendo que Durão Barroso afirmou que “nunca lhe passaria pela cabeça aplicar portagens nas SCUTS.”, perante o olhar estupefacto que a mesma estação logo exibiu. Se fosse um jornalista, faria do comentário a sua primeira pergunta.

Nada disto se passou com Marcelo, que sai como um mito televisivo. É claro que Marcelo é tendencioso, é claro que não gosta de Santana Lopes. Nunca o escondeu. A diferença entre ele e um comentador, como é Sousa Tavares, como é Pacheco Pereira, é que ele é ex líder do partido. Está acima da carne seca. E, para Marcelo, ser Ministro seria desprestigiante.

O que é surpreendente é não haver análise que antecipasse um cenário tão previsível. Conhecendo Marcelo minimamente, era de prever clara e inequivocamente que qualquer crítica só o reforçaria. Tal como acontece ao pequeno grupo de pessoas que tem o que tem Marcelo tem: carisma.

Quem criou um facto político foi Gomes da Silva. Marcelo agora continua com as suas aulas, daqui a uns tempos lança um livro e será aclamado da esquerda à direita.

Pois é. Saber quem é o bom, o mau e o vilão é que é mais difícil.

Avalon

1 Comments:

At 7:14 da manhã, Anonymous Anónimo said...

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