Saudade
D. Duarte, Duarte Nunes de Leão, Almeida Garret e Pascoaes, entre outros antigos, tinham a palavra saudade ( soidade para D. Dinis) como um exclusivo pátrio, um termo só da nossa terra, intraduzível.
Dizia mesmo o Visconde João Baptista que “... o sentimento por ele representado, certo que em todos os países o sentem; mas que haja um vocábulo especial para o designar, não sei de nenhuma outra linguagem senão da portuguesa...”
Só mais à frente, século passado adentro, tal ideia, quase mágica, foi removida.
De facto, outras nações têm para a saudade um termo só seu: o galego tem soledades ou soedades; o catalão, anyoransa ou anyoramento; o italiano, desio ou disio; o romeno doru ou dor; o sueco, saknad; o dinamarquês, savn; o islandês, saknaor, e o alemão sehnsucht.
O filólogo Manuel de Melo abriu o capote a este bicho, com luzimento, em Notas Lexicológicas.
Falando das canções melancólicas dos romenos, Cratiunesco volteava sobre doru:
“Ce mot semble venir du mot latin desiderium, dont il exprime tous les nuances – le regret d´un bien perdu, le chagrin que cause son absence, l´ésperance de le recouvrer, le désir d´un bonheur, que l´on ne connait point encore et l´ivresse que en accompagne la posséssion.”
E, em francês, dava-se ao doru do poeta Alecandri o sentido de “désir mêlé de regret”.
Vamos, ainda, ao Purgatorio, com Dante:
“Era giá l´ora che volge il disio
Ai naviganti, e intenerisci il cuore
Lo di che han ai dolci amici addio;
E che lo nuovo peregrin d´amore
Punge, se ode aquilla di lontano,
Che peja il giorno pianger che si more”
( “C´était déja l´heure qui réveille les regrets
des navigateurs et attendrit leur âmme”, etc.
-Fiorentino)
Saudade, essa palavra para uma “mimosa paixão da alma” (D. Francisco Manuel de Melo), não é só nossa.
E é de folgar que seja assim.
O contrário seria uma desordenança.
Das grandes.
Guido Sarraza
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