31.8.06

A invenção do Sporting e a tourada

Versado na matéria, o Sporting tem hoje, desta vez no Campo Pequeno, mais uma tourada.
Porque a coisa se prende com festejos do centenário, vem a talhe de foice recordar a génese da simpática agremiação, a quem os adeptos dos mais variados clubes tantas alegrias devem.

Recorre-se a Miguel Esteves Cardoso (vd. suplemento do dn de 27 de Maio, o DNA nº 443), que, em termos de antologia, escreveu sobre o tema, com o título "Só para benfiquistas", e porque, afinal, "aquela bela bela rapaziada (os sportinguistas) não merece continuar mergulhada na escuridão quanto às origens.." :

«A verdade é que o "sporting" foi inventado às duas e meia da manhã no restaurante Tavares por quatro benfiquistas bem barbudos e regados - como piada.
E, dada a alcoolização dos convivas, não espantará que tenha sido uma má piada.
"Ouve lá, disse um dos jantarantes, o que tinha graça era criarmos outro clube de futebol aqui em Lisboa para a malta se rir um bocado..." »


bventana

Vai à pastelaria de pasteleira

"As minhas fãs são porreiras e não guincham"
Jose Cid



O mitinho está cada vez mais rabino. Todos os dias aparece e manda uns pensamentos, mas, hoje (in Sábado) , avantajou-se:
"Tenho uma pasteleira velha e gosto de ir nela à pastelaria..." e "As pessoas que não têm vícios vão para o céu. Quem tem vai para todo o lado. Eu, como não gosto de andar de um lado para o outro, vou começar a organizar novos vícios. Mas ainda não sei quais.", são bocadinhos daqueles que perduram.
Dentro dos brincalhões, é figura.


crisdovale

Charlas sotto voce

Haja quem ajude o valet de chambre e lhe conte que o servilismo, sobretudo se reiterado, não enobrece, antes pelo contrário.
Quanto ao entrevistado, já não deve valer a pena lembrar-lhe que elogio em boca própria é vitupério.


crisdovale

Nunca te desconheci

Êxtase


Terra, minha medida!
Com que ternura te encontro
Sempre inteira nos sentidos,
Sempre redonda nos olhos,
Sempre segura nos pés,
Sempre a cheirar a fermento!
Terra amada!
Em qualquer sítio e momento,
Enrugada ou descampada,
Nunca te desconheci!
Berço do meu sofrimento,
Cabes em mim, e eu em ti!


Miguel Torga
Monforte do Alentejo, 1968



bvtana

Coisas boas nesta vida

Nadar em tomate
Buñol, 300 quilómetros a sudeste de Madrid, realiza todos os anos a "Tomatina", uma festa que atrai milhares de espanhóis e de turistas estrangeiros e em que o único objectivo é espalhar toneladas de tomate pelas ruas. A tradição remonta a meados de 1940.

Foto: Fernando Bustamante/AP (publico on line-31.8)



crisdovale

Sumptuous is the word




"It was really beautiful - I think only the Latin-Americans still do it that way: all the military officers were in full-dress uniform, and the ambassadors were in court dress. Sumptuous is the word, and sparkling.
As we entered, George made a bee-line for this gorgeously crimson-clad figure, and said, "Excuse me, but may I have the pleasure of this dance?"
There was a terrible silence for a moment before the guest, who knew who he was, replied, "There are three reasons, Mr. Brown, why I will not dance with you. The first, I fear, is that you have had a little too much to drink. The second is that this is not, as you seem to suppose, a waltz the orchestra is playing but the Peruian natinal anthem, for which you should be standing to atention. And the third reason why we may not dance, Mr Brown, is that I am the Cardinal Archbishop of Lima... "

(Peter Paterson - "The Life of Lord George Brown")




bventana

30.8.06

Bem conduzido

«(...) Tendo analisado e debatido a situação e as possíveis modalidades de participação, deliberou, por unanimidade, dar parecer favorável à contribuição de Portugal para satisfação do pedido das Nações Unidas, associando-se ao esforço dos restantes Países europeus em prol da paz naquela região, com o envio de um Companhia de Engenharia de Construções, com efectivo até 140 militares, para colaborar nas acções de reabilitação das infra-estruturas destruídas durante o conflito. A duração da Missão da Companhia será avaliada de acordo com o calendário estabelecido pela ONU (...)»

A serenidade, a competência e o bom senso continuam a prevalecer. E é muito bom que assim seja. Pese embora o desapontamento dos cultores de teatrinhos de robertos... mas, esses, amanhã, têm fruta fresca.


crisdovale

Vice Versa



"Dili 30 Ago (Lusa) - O major Alfredo Reinado fugiu hoje da cadeia de B ecora, em Díli, juntamente com outro 56 reclusos, incluindo 16 ex-membros das fo rças armadas timorenses e cinco condenados por homicídio, disse à Agência Lusa f onte oficial.
Os 57 fugitivos, que representavam 28,5 por cento dos 200 detidos em Be cora, saíram pela porta principal do estabelecimento cerca das 15:00 locais (07: 00 em Lisboa), sem, aparentemente, qualquer oposição por parte dos membros da se gurança, de acordo com fontes contactadas pela Lusa."


Será que a rapaziada do General Alcazar não se precata com a rapaziada do General Tapioca?
Ou vice versa?


crisdovale

29.8.06

Lança o olhar ao longe e ao largo


«(...) a umas cinquenta milhas da cidade (de Lisboa) , subindo o rio, fica o ópido de Santarém, de grande antiguidade e muito famoso de entre diversos outros ópidos da Lusitânia. A seu respeito, Plínio testemunha que foi a quinta colónia lusitana e que outrora lhe deram o nome de Praesidium Julium. A nossa gente chama-lhe hoje Santarém. A seu respeito os interessados pelas coisas antigas encontrarão muitos dados no nosso Resende.

Porque está localizado no cimo de um monte muito alto, lança o olhar ao longe e ao largo por uma extensa planície, que é dividida ao meio pelo Tejo e cuja terra apresenta extrema fertilidade, pois leva vantagem a todas as outras, por tal modo que escassos trabalhos agrícolas asseguram todos os anos, em vales reduzidos, inacreditáveis quantidades de trigo; a tamanha fertilidade do solo não ficará mal associar um dado, embora dizê-lo a muitos possa parecer difícil de acreditar: é que sessenta dias após ter sido começada a sementeira os cereais num curto período de tempo ficam grados, ceifam-se bem maduros, malham-se e, se for caso disso, moem-se.»

Damião de Goes
(Elogio da cidade de Lisboa)


guido sarraza

Imperdível

A "POBREZA FRANCISCANA", mesmo refreada por um semáfaro pode ser impressionante.


crisdovale

A barretina e o can-can






Juntam-se agora alguns e algumas, que sem razão para "desilusões", pela razão simples de não terem chegado a iludir-se, clamam por "mais qualquer coisinha".
No fundo, queriam can-can.






bruno ventana

Por estes calores de Estio




Por toda a parte a água sussurrante, a água fecundante... Espertos regatinhos fugiam, rindo com os seixos; grossos ribeiros açodados saltavam com fragor de pedra em pedra; fios direitos e luzidios como cordas de prata vibravam e faiscavam das alturas dos barrancos; e muita fonte, posta à beira de veredas, jorrava por uma bica, beneficamente, à espera dos homens e dos gados...

Eça de Queiroz



guido sarraza

Panorâmicas e vistas gerais

«Mas há a distância, e a distância inventa cidades, como bem sabemos »




«Passo adiante. Agora estou virado a sul em formato postal e tu, Lisboa, com o rio em fundo num azul de entontecer. O tejo visto do mastro real, poderia dizer-se.

Do alto vos falo, onde

Acrescento azul de muitas cores

Ao outro azul que os vossos olhos vêem,


seria o aparte de Pedro Tamen se aqui estivesse. E eu faria que sim, mais que convicto, porque em poucos lugares como este de tantas cores cada cor é feita.

(...)

Nós, tanto quanto me apercebo, estamos os dois em mais ou menos: tu, cidade desfocada pela luz mundana dos videoturistas que te vieram espreitar de miradouro, eu um pouco à margem porque, para mim, panorâmicas e vistas gerais são quase sempre frases feitas ou cenários de catálogo.»


José Cardoso Pires



brunoventana

Não tem porquê

Pois como há-de ser o amor para ser fino?


guido sarraza

Innuendo

“Sois charmant et tais toi”
Baudelaire



“Personne ne m´a jamais paru avoir dans la conversation un charme comparable au sien…

Elle ne parlait que par nuances; jamais elle n`a dit un bon mot; c´était quelque chose de trop exprimé.

Les bons mots se retiennent, et elle ne voulait que perdre ce qu´elle disait.

Les bons mots se retiennent!”


Charles Maurice Talleyrand-Périgord



bvtana

28.8.06

La clarté dans la confusion

«Quem protege quem em Timor? Essa parece ser a questão perante uma maior organização de bandos de jovens que atacam particularmente as forças australianas.Cuidado com as querelas dos outros que andamos a comprar.»
posted by josé medeiros ferreira@ 10:44

(in bicho carpinteiro)


crisdovale

Haver, ele já havia

Já havia no tempo de Guerra Junqueiro gente como a que está a governar(-se) no futebol português e continua a aparecer nas pantalhas com uma desfaçatez só ao alcance dos grandes tunantes:

«…corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que honrados (?) na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que…sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (…)»


crisdovale

27.8.06

O tigre volta a rugir

Acontecimento. O extremo-oriente ficou mais perto. Passa a ser visto, por dentro, através de uma panelinha de baixa prosa.

O autor traz a porção de aisance que estas coisas recomendam:
« ... para começar, devo dizer que encaro este blogue como um chefe de cozinha com estrelas Michelin deve encarar o MacDonalds»

O mundo ficou mais pequeno.


bruno ventana

De canelada pronta e fé na Virgem


«"Manuel Monteiro leva ideologia à praia" é o título de uma notícia do Expresso.
Uma pessoa fica pasmada e vai ver melhor. É mesmo verdade, é mesmo verdade...
(...)
O bom povo veraneante de Vila Praia de Âncora que se precate. O dr Monteiro anda atrás dele para "fundar a direita como tal". "Como tal", convém notar.
O sr D. Duarte de Bragança, por seu lado, não podendo fundar a monarquia, tenciona inteligentemente refundar a monarquia. E, com a subtileza que o distingue e distingue a raça, resolveu oferecer a Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa a 47 membros da selecção de futebol, "por feitos notáveis prestados à Pátria" (a gramática que se lixe).
(...) e o mundo ficará a saber que no campeonato da Europa sairão daqui três dúzias de bravos "cavaleiros", de canelada pronta e fé na Virgem. Claro que a Ordem da Conceição já não existe e que o sr D. Duarte oscila entre o ser e o não-ser. Não interessa.
(...)
Não tarda nada o sr Manuel Monteiro e o duque de Bragança irrompem no Rossio, vestidos de cetim e lantejoulas, põem um tapete no chão e começam às cambalhotas, para converter a populaça à monarquia e à direita (nova e como tal). Esperemos que na Câmara dê licença e que, no Porto, o sr Rui Rio se Mostre tolerante.
Ninguém deve contrariar um maluquinho com uma causa. Principalmente, um maluquinho "famoso" »

Vasco Pulido Valente
Publico-27.8


cristovaodovale

Cela ira encore mieux


"6 octobre 1814

Grand diplomate, le prince de Talleyrand détestait l'ambiguïté dans les traités internationaux et aimait que les choses fussent dites clairement. Son souci de clarté l'amena à énoncer cette maxime qui est devenue proverbiale.

A Vienne, le 6 octobre 1814, Metternich, ministre autrichien des affaires étrangères, venait de lire un projet tendant à ajourner l'ouverture du congrès au 1er novembre. Talleyrand demanda que l'on ajoutât que l'ouverture du congrès:

"sera faite conformément aux principes du droit public".

"A ces mots, raconte Talleyrand, il s'est élevé un tumulte dont on ne pourrait que difficilement se faire l'idée".

Les Prussiens furent les plus violents et leur représentant, le prince Von Hardenberg, hurla:

"Non, monsieur, le droit public, c'est inutile. Pourquoi dire que nous opérons selon le droit public? Cela va sans dire."

"Si cela va sans dire, cela ira encore mieux en le disant",
répliqua Talleyrand."

(Jean Levant website)



brventana

Saberes

De mulheres, quem a sabia toda era Francisco Rodrigues Lobo.
É ver.


guido sarraza

Honni soit qui mal y pense


"C'est au cours d'un bal que la Comtesse de Salisbury, maîtresse du roi d'Angleterre Edouard III, perdit lors d'une danse la jarretière bleue qui maintenait son bas. Edouard III s'empressa de la ramasser et de la lui rendre. Devant les sourires entendus et railleurs de l'assemblée, le roi se serait écrié en français, alors langue officielle de la cour d'Angleterre : "Messieurs, honni soit qui mal y pense !"


guido sarraza

26.8.06

Do próprio mistério


A bolota taluda ficara ali muito quieta, muito bem refastelada em virtude do próprio peso, enterrada que nem pelouro de batalha depois de passarem carros e carretas. Que fazer senão deitar-se a dormir?! Dormiu uma hora ou uma vida inteira, quem sabe?! Um laparoto veio lá de cascos de rolha, rapou a terra, fez um toural, aliviou-se, e ela ficou por baixo, sufocada sem poder respirar, em plena escuridão. Estava no fim do fim? Um belisco, e do seu flanco saiu como uma flecha. Era de luz ou de vida? Era uma fonte ou antes um cântico de ave, de água corrente, de vagem a estalar com o sol (... )? Era tudo isto, encarnado no fogo incomburente que lhe lavrava no flanco, verbo que acabou por irradiar do próprio mistério do seu ser.

Do pinhão, que um pé-de-vento arrancou da pinha-mãe, e da bolota, que a ave deixou cair no solo, repetido o acto mil vezes, gerou-se a floresta.

Aquilino Ribeiro



crisdovale

From whence we came

All of us have in our veins the exact same percentage of salt in our blood that exists in the ocean, and, therefore, we have salt in our blood, in our sweat, in our tears. We are tied to the ocean. And when we go back to the sea - whether it is to sail or to watch it - we are going back from whence we came.

John F. Kennedy,
Speech given at Newport at the dinner before the America's Cup Races, September 1962



crisdovale

Despojados, sérios e finos

A matula que (se) governa há decadas (n)o futebol português tem com o "caso Mateus" um momento de apoteose. A inépcia no tratamento de uma minudência regulamentar detectada há mais de quatro meses - qualquer paquete de Tribunal resolvia o "caso" entre dois pacotes de pevides - é demasiada, mesmo para os grunhos do sector.
Fia mais fino o cenário, quando nele ainda se passeiam os sobreviventes, incólumes, do famigerado "Apito Dourado". O Jorge Nuno entra no campeonato com o pé direito e na Liga vai ainda pontificando o inenarrável Major, seu companheiro de tantas lutas, enquanto o ramalhete não se compõe com a entrada da magnífica encomenda que é a última aquisição: o assombroso Hermínio Loureiro.
Não há no país inteiro, já não se pede um tenente Cattani, mas uma pessoa séria e determinada com poder institucional que pare esta porcaria?
Talvez que o vexame tenha que chegar ao ponto de ser a FIFA a tirar o balde da lavadura da frente destes finos comensais.


crisdovale

Não está fácil

«De acordo com os termos assinados hoje [25 de Fevereiro] entre o Chanceler do MIT, Phil Clay, e o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, José Mariano Gago, esta fase inicial vai ser realizada em estreita colaboração com o próprio MIT, devendo estar concluída até Julho».
O Projecto MIT não está esquecido, pois não?
# posted by PG : 00:08

(in bloguitica)



crisdovale

25.8.06

Os matizes


«A abolição dos matizes facilita muito as coisas na hora de julgar um ser humano, analisar uma situação política, um problema social, um acto de cultura e permite dar livre curso às filiações e às fobias pessoais sem censuras e sem o menor remorso.
Mas é, também, a melhor maneira de substituir as ideias pelos estereótipos, o conhecimento racional pela paixão e pelo instinto e de malentender tragicamente o mundo em que vivemos. Há certos conflitos que, pela violência e pelos antagonismos que suscitam, levam quase irresistivelmente aqueles que os vivem ou seguem de perto a liquidar os matizes a fim de promover melhor as suas teses e, sobretudo, desbaratar as dos seus adversários.»

M. Vargas Llosa
(in dn-25.8)


crisdovale

"Praticamente apolítico"

«(...) Desde a campanha para secretário-geral do PS que o engº Sócrates, de momento primeiro-ministro, adoptou a técnica, de resto conhecida e experimentada, de falar o menos que pode. E, quando fala, fala do vago e do geral ou por interposta pessoa, menor e desmentível. O Governo seguiu e segue a mesma disciplina. Ministros saem e entram, à pressa, quase clandestinamente. Tirando a senhora da Educação, nenhum deles, de resto, explicou ainda o que pretende e para onde vai. (...) »

Vasco Pulido Valente
25.8.06



crisdovale

Quem foi Euclides?



" (...)

Cardoso Pires - Tive professores como o Câmara Reis, de Literatura, que era um bom professor. Mas era um bom professor não para um Liceu, mas para uma Universidade. Ele partia do princípio de que toda a gente já sabia o mínimo. E 90% não sabia.
J.C. Amarante - Portanto dava aulas para níveis mais avançados...
Cardoso Pires - A mim, esse professor deu literatura e foi um deslumbramento.
J. C. Amarante - Porquê?
Cardoso Pires - Porque ele falava de autores de que eu nunca tinha ouvido falar. Lembro-me muito bem que nessa altura (eu já tinha 15 anos), li o grande escritor da minha vida, o Ferreira de Castro. Foi um contacto que me transformou. Já estava farto de Bernardim Ribeiro.
J. C. Amarante - Houve outros professores?
Cardoso Pires - Sim, no 6º ano tive a sorte de encontrar um professor de Matemática, muito temido, chamado Alberto Beirão, que chumbava cavalarmente. Mas havia um grande respeito por ele. Quando aparecia numa turma, ficava tudo com medo porque, para começar, dava logo uma vassourada. Esse professor gostava muito de falar de História da Matemática e isso interessou-me. Eu não terminei o curso de Matemática por causa de duas cadeiras.
J. C. Amarante- Mas houve um outro professor de Matemática?
Cardoso Pires - Sim, houve. E era muito parecido com o Prof. Alberto Beirão. Ao explicar uma coisa, ele dizia, por exemplo, «este teorema foi inventado por Euclides. Quem foi Euclides?». Aquilo embalava as pessoas. De maneira, que pela primeira vez, tive notas razoáveis.

(...) "

José Cardoso Pires
(in Noesis-nº46-ABR/JUN 1998)


bruno ventana

24.8.06

Everness





Sólo una cosa no hay. Es el olvido.
Dios, que salva el metal, salva la escoria
Y cifra en Su profética memoria
Las lunas que serán y las que han sido.

Ya todo está. Los miles de reflejos
Que entre los dos crepúsculos del día
Tu rostro fue dejando en los espejos
Y los que irá dejando todavía.

Y todo es una parte del diverso
Cristal de esa memoria, el universo;
No tienen fin sus arduos corredores

Y las puertas se cierran a tu paso;
Sólo del otro lado del ocaso
Verás los Arquetipos y Esplendores.



jorge luis borges


guido sarraza

À bord de l’Intermezzo

Naufrage du trimaran: le scénario des enquêteurs



crisdovale

A respeito de primores

Prestou-se hoje alguma atenção a um denominado Tadeu que, apanhando a jeito uma folha de papel colorido, escachou dos penhascos da mioleira uma embustice, logo a seguir desmontada pelo visado e pela Polícia Judiciária.
A reles peripécia teve, ainda assim, um mérito: o de lembrar o grande Fialho de Almeida, que dedicou a taludos deste género algumas páginas:

«À medida que a hora de comer ia chegando, notou-se que em cada um dos orangos... começavam a surgir fenómenos de sociabilidade extraordinários. Por exemplo, alguns puseram camisa lavada, outros ornaram-se de casacos de gala e chapéus de forma tubular:estes foram ao Grandella comprar gravatas...
(...)
Se a amplitude do ponto permitisse, havia d´explanar aqui detalhes curiosíssimos, por onde inferir té certo ponto a argúcia quase humana dos macacos. Basta um detalhe. Constatam as observações do dr. Paul Sollier que nos chamados macacos jantareiros, à semelhança do que sucede nos idiotas, os sinais d´alegria aumentam quando a comida é de borla, ou em casos pagantes, quando o criado do restaurante errou a conta para menos.
Mais: substituindo alguns dos pratos, por palha, o animal dá profundos sinais d´irritação.»


crisdovale

Subir e descer

«A seta para subir, segue violentamente as forças do arco e do impulso, mas para descer não tem necessidade de braço alheio, a mesma natureza a leva sem violência ao baixo, e quanto mais baixo, tanto mais depressa.
A barquinha posta na veia do rio, com a vela tomada e os remos recolhidos, levada só do ímpeto da corrente como em ombros alheios, tão descansadamente desce, como apressada. Pelo contrário, ao subir pelo mesmo rio acima, seja o vento embora tão forte que quase rebente as velas, e os remeiros tão robustos que quebrem os remos, mais é a água que suam que a que vencem.
Nós mesmos para subir a um monte, é com tanta dificuldade e moléstia, que a própria respiração se cansa e se aperta, mas para descer ao fundo do vale o mesmo peso do corpo o ajuda, aligeira e move; e mais levados que andando, chegamos sem cansar ao lugar mais baixo e último. Tão fácil é o descer, e tão dificultoso o subir.»

Padre António Vieira


crisdovale

23.8.06

Onde o tempo caminha





Alentejo

A luz que te ilumina,
Terra da cor dos olhos de quem olha!
A paz que se adivinha
Na tua solidão
Que nenhuma mesquinha
Condição
Pode compreender e povoar!
O mistério da tua imensidão
Onde o tempo caminha
Sem chegar!...


miguel torga
Sousel, 20 de Outubro de 1974


brvta

Esse quase nada

“The worst thing about being a depraved pirate is having to work with a bunch of depraved pirates”


Refazendo, com Camilo, o ponto à navegação:

«Temos tudo quanto podem ambicionar os netos daqueles que civilizaram mundos novos.
Só nos falta – diga-se a verdade sem presunção – falta-nos uma pequena coisa, que faça os homens bons:
falta-nos a virtude e a moral; falta-nos o respeito à lei, e a lei que deva respeitar-se; falta-nos esse quase nada que faz um povo de traficantes e de corruptos uma sociedade de irmãos e de amigos…»


guido sarraza

22.8.06

Outras mais brilhantes

"Todo o português popular é um reformador impaciente. Não há atitude que não avalie, serviço que não comente, governança que não desconheça, ingratidão que não ouse, para maior desembaraço das suas aptidões. Estas podem não ser famosas, mas constituem a soma dum profundo sentido de perseverança e de sacrifício. Quando o mundo se super-humanizar, lá estará o português para achar natural o que acontece, e portanto necessitado de reforma, e por conseguinte de diálogo. O último homem sobre a terra terá de ser um português que duvida do que é natural e que se indisciplina perante a consumação dos séculos.
Há raças mais dinâmicas, outras mais brilhantes; mas nenhuma outra possui o segredo da importunidade que estimula, desassossega, altera, contradiz e, no entanto, não chega a ser violência. Dizei-lhe que a vida é um dom, que o trabalho é uma honra, que o homem é uma criação maravilhosa - e ele, ou vos acha hipócritas, ou ocos e delirantes. Os princípios «a piori» não lhe merecem respeito, e prefere analisar os seus pequenos problemas quotidianos, a obstinar-se na seriedade ou atrofiar-se na eloquência que é a mãe da burla. Ele sabe que a pior injúria é enobrecer a desgraça. Ele sabe que a pior opressão é dar rosto prazenteiro às realidades sinistras."




Agustina Bessa-Luís
'Alegria do Mundo'



crisdovale

Catedral, 20.15








« In boca al lupo...
Crepe´il lupo ! »




bruno ventana

Tesa de frescura






"AMIGOS PENSADOS: JOSÉ CARDOSO PIRES"



Ao Zé Cardoso peço uma miúda

com um toque de chiado ou de grandella

às nove e duas pernas da manhã,

que, como o peixe, tesa de frescura,

tenha perdido a escama de donzela,

mas não venha falar-me do Vailland..."




Alexandre O`Neill
(Dispersos-Nov.1962)



bvtana

Com eco


"Quando as pessoas deixam de acreditar em Deus, como costumava dizer Chesterton, não é que já não acreditem em nada, acreditam é em tudo.
Até nos meios de comunicação."



Umberto Eco


bvtana

Por la misma rázon


Sustento en fin lo que escribi y conozco
Que aunque fuera mejor de otra manera,
No tuvieran el gusto que han tenido
Por que as veces lo que és contra el justo
Por la misma rázon deleita el gusto.



Lopo de Vega

Arte Nueva de Hacer Comedias




bvtana

21.8.06

El secretismo?



" .... para ler este texto de Mario Vargas Llosa. Na verdade não é apenas sobre Cuba, é sobre nós:... "

(via Blasfémias)

crisdovale

O jogo da dama



KWAHERI MEANS FAREWELL

“How do you get to Neverland? Wendy asked.
Second star to the right, and straight on till morning “

JM Barrie (“Peter Pan”)


A map in the hands of a pilot is a testimony of a man's faith in other men; it is a symbol of confidence and trust. It is not like a printed page that bears mere words, ambiguous and artful, and whose most believing reader--even whose author perhaps--must allow in his mind a recess for doubt.

A map says to you, 'Read me carefully, follow me closely, doubt me not. It says, 'I am the earth in the palm of your hand. Without me, you are alone and lost.'

And indeed you are. Were all the maps in this world destroyed and vanished under the direction of some malevolent hand, each man would be blind again, each city be made a stranger to the next, each landmark become a meaningless signpost pointing to nothing.

Yet, looking at it, feeling it, running a finger along its lines, it is a cold thing, a map, humourless and dull, born of calipers and a draughtsman's board. That coastline here, that ragged scrawl of scarlet ink. shows neither sand nor sea nor rock; it speaks or no mariner, blundering full sail in wakeless seas, to bequeath, on sheepskin or a slab of wood, a priceless scribble to posterity. This brown blot that marks a mountain has, for the casual eye, no other significance, though twenty men, or ten, or only one, may have squandered life to climb it. Here is a valley, there a swamp, and there a desert; and here is a river that some curious and courageous soul, like a pencil in the hand of God, first traced with bleeding feet.

Here is your map. Unfold it, follow it, then throw it away, if you will. It is only paper. It is only paper and ink, but if you think a little, if you pause a moment, you will see that these two things have seldom joined to make a document so modest and yet so full with histories of hope or sagas of conquest.

No map I have flown by has ever been lost or thrown away; I have a trunk containing continents....”


Beryl Markham
(“West with night”)


Bruno Ventana

Ideias boas


















Tu já tinhas um nome, e eu não sei

se eras fonte ou brisa ou mar ou flor.

Nos meus versos chamar-te-ei amor.





Eugénio de Andrade



guidosarrasa

Oa alcatruzes da nora



"Depende de quem passe para que eu seja túmulo ou tesouro."

Paul Valéry



guidosarraza

19.8.06

A barcos e bruma

Procura a maravilha.

Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.

No brilho redondo
e jovem dos joelhos.

Na noite inclinada
de melancolia.

Procura.

Procura a maravilha.



Eugénio de Andrade



guido sarraza

Fio de pesca


O mundo, o mar e o amor,

por Carlos Drummond de Andrade.

crisdovale

Na Horta das Benfarras





«Aníbal Cavaco Silva e a mulher, Maria, ontem à tarde, a apanhar figos na Horta das Benfarras, em Boliqueime. A pequena propriedade de três hectares era já propriedade do avô do Presidente da República Joaquim Martins Cavaco, e localiza-se entre a Estrada Nacional 125 e o golfe de Vilamoura. Agora que está de férias no Algarve, o chefe do Estado todos os dias se encontra com o seu pai, Teodoro Silva, de 94 anos. E é entre figueiras, laranjeiras, mangueiras, romãzeiras e alfarrobeiras (estas, na maioria, centenárias) que ambos passam algum tempo juntos.»
(in Expresso online - 19.8)



crisdovale

18.8.06

"Cá estou eu, aí vou"

«Vinde, ó corações despedaçados! Aqui vive-se uma morte intermédia. Aqui podem conhecer-se, sem morrer, maravilhas sobrenaturais. Vinde, vós que odiais o mundo, que vo-lo paga na mesma moeda. Reduzi-vos ao nada. Eu dou mais esquecimento que a morte. Vinde! Levantai a pedra tumular do cemitério e vinde unir-vos a mim.»



... Ouvindo esta voz a leste e oeste, de manhã até à noite, a alma do ferreiro respondeu:
«Cá estou eu, aí vou.» E assim Perth partiu à caça da baleia.



Heman Melville
Moby Dick



guido saerraza

Uma promessa de excedência










« O fim da história, considerada como ciência humana e humanística, não é uma regressão ao passado, mas uma explicação do presente, uma arte de prever e uma promessa de excedência.
(...)
Preocupou-nos sempre e conjuntamente a face da vida extinta do passado e a da vida presente, para explicarmos uma pela outra. E quanto mais tentávamos compreender a segunda, mais descobríamos na sua estrutura as estratificações indeléveis da primeira.
(...)
A primeira lição que a história e a vida nos ensinam é a da transitoriedade dos mitos, dos regimes e sistemas.»



Jaime Cortezão
(citado por Franco Nogueira in "As Crises e os Homens")


crisdovale

"... as pessoas deixam-se apaixonar..."

«(...) Não vá pensar que sou contra os debates ideológicos, a pesquisa de novas formas, a troca serena de ideais...
Mas quem levou a vida a estudar com a serenidade possível os problemas politicos e sociais pode ser levado a crer que todos quantos abordam essas questões o fazem da mesma forma: com objectividade e desejo de encontrar soluções realísticamente válidas. Ora, não é assim: muitas vezes as pessoas deixam-se apaixonar, sob a influência de motivos nada intelectuais, por uma causa que enropam em certo verbalismo colhido numa ideologia. E não discutem: regougam. Nem expõem: proclamam. São críticas cegas e sistemáticas a preceder a condenação global das "estruturas" existentes e a sua substituição radical. Numa palavra: a revolução social. (...)»

Marcelo Caetano in "Conversas com Marcello Caetano" de António Alçada Baptista (Edt. Moraes-1973)


crisdovale

À volta da soidade


D. Duarte, Duarte Nunes de Leão, Almeida Garret e Pascoaes, entre outros antigos, tinham a palavra saudade ( soidade para D. Dinis) como um exclusivo pátrio, um termo só da nossa terra, intraduzível.

Dizia mesmo o Visconde João Baptista que “... o sentimento por ele representado, certo que em todos os países o sentem; mas que haja um vocábulo especial para o designar, não sei de nenhuma outra linguagem senão da portuguesa...”

Só mais à frente, século passado adentro, tal ideia, quase mágica, foi removida.

De facto, outras nações têm para a saudade um termo só seu: o galego tem soledades ou soedades; o catalão, anyoransa ou anyoramento; o italiano, desio ou disio; o romeno doru ou dor; o sueco, saknad; o dinamarquês, savn; e o islandês, saknaor.

O filólogo Manuel de Melo abriu o capote a este bicho, com luzimento, em Notas Lexicológicas.

Falando das canções melancólicas dos romenos, Cratiunesco volteava sobre doru:
“Ce mot semble venir du mot latin desiderium, dont il exprime tous les nuances – le regret d´un bien perdu, le chagrin que cause son absence, l´ésperance de le recouvrer, le désir d´un bonheur, que l´on ne connait point encore et l´ivresse que en accompagne la posséssion.”

E, em francês, dava-se ao doru do poeta Alecandri o sentido de “désir mêlé de regret”.

Vamos, ainda, ao Purgatorio, com Dante:

“Era giá l´ora che volge il disio
Ai naviganti, e intenerisci il cuore
Lo di che han ai dolci amici addio;

E che lo nuovo peregrin d´amore
Punge, se ode aquilla di lontano,
Che peja il giorno pianger che si more”


( “C´était déja l´heure qui réveille les regrets
des navigateurs et attendrit leur âmme”, etc.
-Fiorentino)

Saudade, essa palavra para uma “mimosa paixão da alma” (D. Francisco Manuel de Melo), não é só nossa.
E é de folgar que assim seja.
O contrário seria uma desordenança.
Das grandes.



Guido Sarraza

Os intemporais



With pleasures too refined to please
With too much spirit to be ever at ease
With too much quickness to be ever thought
With too much thinking to have common thought


Alexander Pope



guido sarraza

"Conversas com Marcello Caetano"


«(...) Estou a ouvi-lo e a pensar que, se não tivesse responsabilidades de Governo, diria coisas muito próximas daquelas que está a dizer. Gostaria de viver numa sociedade livre onde o respeito pela pessoa e pela liberdade dos outros fosse uma preocupação constante de cada cidadão. E é isso que, como governante, o que também desejaria.
Mas o processo da liberdade é muito complexo e feliz estaria eu se a liberdade fosse uma coisa que os governos pudessem oferecer. Costuma dizer-se que a liberdade não se recebe, conquista-se. Só que não é pelo verbalismo irresponsável nem pelo anarquismo revolucionário que os povos podem conquistar as liberdades de que precisam. Eu entendo que os cidadãos só conquistam a liberdade à maneira que vão assumindo responsabilidades.
As liberdades dos cidadãos estarão sempre dependentes da estabilidade social que aos governos cabe garantir. Quando o uso da liberdade a põe em perigo, a autoridade terá sempre de ser exercida.
(...)
Repare ainda numa coisa que é muito importante: esta actividade a que chamam vulgarmente "política" e que pode ser elemento de perturbação duma sociedade, passa-se ao nível duma minoria, muitas vezes divorciada do que efectivamente constitui a Nação (...)»

Marcelo Caetano in "Conversas com Marcello Caetano" de António Alçada Baptista (Moraes ed. 1973)


crisdovale

Louvor da língua aprazível

“...e, levantando-se ele, se despediram todos com muita cortesia, deixando ao senhor da casa magoado de se acabar tão depressa a conversação; que quem sabe estimar a que é tão boa, tem sentimento das horas que dela perde.”
F.R.Lobo
« (...)

- Bravamente é apaixonado o senhor D. Júlio (acudiu o Doutor) pelas cousas da nossa Pátria, e tem razão, que é dívida que os nobres devem pagar com maior pontualidade à terra que os criou. E verdadeiramente que não tenho a nossa língua por grosseira, nem por bons os argumentos com que alguns querem provar que é essa; antes é branda para deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar, breve para resolver e acomodada às matérias mais importantes da prática e da escritura.

Para falar é engraçada com um todo senhoril, para cantar é suave com um certo movimento que favorece a música; para pregar é substanciosa, com uma gravidade que autoriza as razões e as sentenças; para escrever cartas nem tem infinita cópia que dane, nem brevidade estéril que a limite; para histórias nem é tão florida que se derrame, nem tão seca que busque o favor das alheias.

A pronunciação não obriga a ferir o céu da boca com aspereza, nem a arrancar as palavras com veemência de gargalo. Escreve-se da maneira que se lê, e assim se fala.
Tem de todas as línguas o melhor: a pronunciação da Latina, a origem da Grega, a familiaridade da Castelhana, a brandura da Francesa, a elegância da Italiana. Tem mais adágios e sentenças que todas as vulgares, em fé da sua antiguidade.

E se à língua Hebreia, pela honestidade das palavras, chamaram santa, certo que não sei eu outra que tanto fuja de palavras claras em matéria descomposta quanto a nossa. E, para que diga tudo, só um mal tem: e é que, pelo pouco que lhe querem os seus naturais, a trazem mais remendada que capa de pedinte.

(...)»

Francisco Roíz Lobo
"Corte na Aldeia"


guido sarraza

17.8.06

Para dar o elegante







«Duas horas de sala de armas, alguns minutos de cabeleireiro e de clube, um bom alfaiate, uma ponta de desdém, e certo ar fatigado de quem esperdiça a vida sem lhe saborear dos proveitos, bastarão para dar o elegante.»


Fialho de Almeida


guidosarraza

Com precisão e justeza


«Em literatura o estilo é como o álcool para os corpos embalsamados:
conserva-a.
Toda a literatura que resiste à corrosão do tempo deve-o ao estilo.
Homero, Cícero, Shakespeare, Camões, Voltaire, Tolstoi foram grandes estilistas.
Quer isto dizer que o estilo seja uma arte? De modo algum.
Mas sem estilo nenhuma obra se salva.
Acresce que a nossa língua está tão pouco clarificada que apenas pensa com precisão e justeza quem escreve correctamente.
Julgar que em nome duma postiça originalidade ou evidenciação do humano haja de se abolir a técnica é pueril.
E fazer tábua rasa da experiência adquirida no domínio da expressão não pode deixar de representar um inútil, inglório e malogrado intento.
A palavra é como o mármore na estátua; dar a essa matéria semblante de vida, curvas voluptuosas, sombras quentes, frémito, solidez, eis o difícil objectivo que não se alcança de golpe. Com verbo desordenado, segundo a flux apocalíptica da imaginação, só poderá obter-se uma turva e destrambelhada arte.»



Aquilino Ribeiro



guido sarraza

16.8.06

De tempo e água




Olhar o rio que é de tempo e água
E recordar que o tempo é outro rio,
Saber que nos perdemos como o rio
E que os rostos passam como a água.



jorge luis borges




brventana

15.8.06

Velocidade em si mesma



«Tudo muda quando o homem delega a faculdade da velocidade numa máquina: a partir de então, o seu próprio corpo sai do jogo e ele entrega-se a uma velocidade que é incorpórea, imaterial, velocidade pura, velocidade em si mesma, velocidade êxtase.
Curiosa aliança: a fria impessoalidade da técnica e as chamas do êxtase.»


Milan Kundera


guido sarrasa

Os intemporais


«Que espécie de homens são esses que têm predilecção pela monotonia do mar? Parece-me que são aqueles que lançaram olhares excessivamente longos e profundos à confusão do mundo interior para poderem exigir do exterior outra coisa a não ser, pelo menos, simplicidade...»

Thomas Mann
(Os Buddenbrook)



guido sarraza

Convite a Angela






Depois de assaltar despudoradamente o território sem o nomear, fica a recomendação de uma visita demorada a um sítio encantador: Terres de femmes.

E o que se pode fazer para doirar a pílula, tendo o assalto envolvido também a Baronesa Tamara de Lempicka-Kuffner, é convidar Angela para um passeio de Bugatti....




guido sarraza

O jogo da dama


«Não deve causar estranheza que cálculos rigorosos, de ordem histórica e literária, tendentes a dar a uma personagem imaginária o máximo da plausibilidade a levem a embater como por acaso numa personagem real. Continuo a espantar-me com a quantidade e a intensidade das movimentações obscuras que nos orientam para um nome, um facto, uma personagem e não para outro. Entramos aí na floresta sem atalhos.»

Marguerite Yourcenar


guido sarraza

De l'aphorisme obscur retiens la possible étincelle


Suzy Solidor par Tamara de Lempicka, 1933




guido sarraza

Superb track











"This so rocks. They might be advanced in years, but the Stones have still got what it takes to produce quality music. Superb track."
The Rolling Stones: Rain Fall Down
Por aqui fora :http://www.ifilm.com/ifilmdetail/2684608




guido sarraza

Quem isto não entender...


No paladar de mudar mais se sente o gosto agudo.



bvetana

14.8.06

Ponto de arrumação


«Como aliás o senhor ministro dos Negócios já teve ocasião de dizer, se essa questão nos for colocada, então será analisada, como tem acontecido com outras solicitações que nos chegam de organizações internacionais de que Portugal faz parte. Mas neste momento é extemporâneo estar já a falar sobre o assunto.»
(in Corta- Fitas)



crisdovale

Aguçosa confissom e pensoso proposito

"Promove, no lugar da ética, o ardil, a astúcia e o cinismo.
A amizade dos grandes pode ser obtida com servidão ou dinheiro, e mantida com ciúme e obséquios."



"Breviário dos políticos"
Cardeal Giulio Mazzarino


guido sarraza

There is a sea




There is a sea,
A far and distant sea
Beyond the farthest line,
Where all my ships that went astray
Where all my dreams of yesterday
Are mine


(in Contos Exemplares)



bruno ventana

Adeus até outro dia




« (...) Ah, e os cigarros! Em 1990, este autor ainda continua a fumar, imagine-se, e a perguntar todos os dias E agora, José. A cada interrogação aspira, fundo e lento, até o morrão do cigarro abrir brasa no vidro do espelho, e há alturas em que encolhe os ombros e pensa de alto «Acta est fabula», se assim me posso exprimir em sinal de despedida.
Mas é um dizer por dizer, nada de especial. Quando menos se esperar, ele aí estará outra vez nesta cadeira e neste lugar, a fazer resumo e projecto de si mesmo, e diga-se de passagem que não se dá mal assim. Como sempre, não tem angústia nem surpresa porque vai encontrar alguém que amanhã, dia comum, recomeça de novo a vida na primeira linha do capítulo que se segue.
Aqui tens, José, o homem que te interroga. Que te fuma e te duvida. Que te acredita.
E com esta me despeço, adeus até outro dia, e que a terra nos seja leve por muitos anos e bons neste lugar e nesta companhia.
Pá, apaga-me essas rugas. Riscam o espelho, não vês? »



José Cardoso Pires


guido sarraza